sexta-feira, 24 de setembro de 2010

O Eterno retorno do mesmo ou de como o PSDB enfeitiçou São Paulo


A massa subjugada bradou por clemência
                                          Raivoso, seu candidato já não escondia as garras
              Por mais um ciclo vão sofrer as agruras e dores...
                                                        é um belo exercício de esquecimento.
No entanto, vão amiúde corroborá-lo no próximo pleito.

Contribuições ao duro diálogo entre as lideranças e a escola

A doutrina materialista de que os seres humanos são produtos das circunstâncias e da educação, [de que] seres humanos transformados são, portanto, produtos de outras circunstâncias e de uma educação mudada, esquece que as circunstâncias são transformadas precisamente pelos seres humanos e que o educador tem ele próprio de ser educado.(...)
A coincidência do mudar das circunstâncias e da atividade humana só pode ser tomada e racionalmente entendida como praxes revolucionante.

Karl Marx – Teses sobre Feuerbach






Observando o decorrer do tempo, nada, afinal, se considera impossível no que concerne às relações humanas: nenhuma transformação, nenhum retrocesso, nenhuma contradição em si mesma. O que mantém tudo junto, o estado humano normal, que em tudo se pode encontrar, é de longe aquilo que é mais forte.

Hugo Hofmannsthal



O conhecimento profundo de si e do que se move ao seu redor é fundamental ao cotidiano de alguém que exerce uma atividade que envolve a liderança. O lider deve ser um sorvedouro de opiniões e idéias filtrando aquilo que é pertinente e orientando o sentido daquilo que não o é. O ato de escutar, com todos os sentidos, é fundamental neste processo. Acolher é  dar respaldo e abrigo ao trabalho da equipe. Procurar maneiras e opções para que o trabalho flua, minimizando ruídos e obstáculos que possam surgir na comunicação. O líder, além de facilitador, deve ser antes um motivador. Alguém que procure servir antes de ser servido. O carisma e o conhecimento do que se faz também se relacionam necessariamente na execução desta tarefa.
Deste modo, liderar uma equipe envolve estar aberto a apreciação das potencialidades desta. Certamente, isto só é possível em um ambiente em que a confiança mútua impere. A equipe deve confiar em seu líder tanto quanto deve poder contar com a confiança que ele deposita nela. O que leva ao fato de que a adaptabilidade às mudanças também se mostra essencial, visto que saber exigir aquilo que se espera é um processo muito delicado e demasiadamente refinado, que deve considerar a escola como um organismo vivo que sofre mutações frequentes e, quase sempre, impactantes. O hábito de fomentar o diálogo é, desta maneira, uma ferramenta crucial para superar as dificuldades e conduzir o grupo, não centralizando as responsabilidades, desacertos e, porque não dizer, os méritos, apenas na figura do administrador. É necessário compartilhar estes processos e construir um espaço de crescimento e desenvolvimento comum que privilegie todos este aspectos, visando a coesão e o fortalecimento do ambiente escolar.

A despeito de todos os empecilhos impostos  ao processo educacional no Brasil, é interessante observarmos como mesmo por meio de uma série de fatores que contribuem para o fracasso da educação brasileira, encontramos experiências isoladas que de maneira inacreditável contrariam estas estatísticas. Obviamente uma série de variáveis contribuem para isso: Localização, colocação sócio-econômica, respaldo do núcleo familiar etc. Baseando-nos em algumas dessas experiências, podemos pensar acerca de algumas práticas fundamentais na melhoria da qualidade de ensino no Brasil.
  • Em primeiro lugar, seria necessário, uma “re-elaboração” da idéia da escola como espaço público. Muitos diretores concebem a escola como uma posse individual e não percebem que o seu dever é propiciar que o ambiente escolar seja um espaço de democratização e discussão para a comunidade. A gestão participativa é primordial na reconstrução da educação no Brasil.
  • Lutar contra a segmentação dos vários grupos que habitam o ambiente escolar, demonstrando que eles devem se completar e não se enfrentar como vem acontecendo na maioria das escolas públicas que pudemos trabalhar. A escola deve propiciar um ambiente sadio de harmonia e respeito mútuo entre os seu atores.
  •  Buscar a valorização do profissional docente, por meio de palestras, discussões, debates, cursos de aperfeiçoamento, atividades extra-curriculares etc.
  • Compartilhar responsabilidades e decisões com a comunidade escolar, por meio do conselho de  escola, da A.P.M, escola aberta, visando uma apropriação do espaço escolar como espaço comunitário e canal de reflexão.
  • Priorizar a qualidade do ensino e do conhecimento que se produz neste ambiente, tomando-a como meta. É dever da escola se superar constantemente, gerando focos que motivem alunos e professores a se desenvolverem continuamente como seres humanos.
  • Utilizar mecanismos diagnósticos de aferição do processo, utilizando-os como uma escala  na aferição do progresso da escola. Não, simplesmente, utilizá-los como uma forma de punição ou um compêndio de meros dados estatísticos.

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Algumas Considerações sobre o morrer em Montaigne

I

Chaque homme porte La forme entière de L´humaine condition.

Michel de Montaigne – Les Essais, Livre III, 2.


Há em Montaigne, um certo elogio da vida comum. Um desconfiar-se das circunstâncias e uma negação de toda possibilidade de generalização sob qualquer aspecto moral ou cognitivo. O homem é um ser ímpar e, por este motivo, dotado de especificidades que só se justificam se tomadas de modo particular. Nenhum modelo, nenhuma proposta ou receita serve para solucionar em um plano amplo os dilemas inerentes ao fato de estarmos vivos. Deste modo, não podemos de maneira alguma construir uma experiência segura acerca do mundo ou da vida, a única experiência que podemos vislumbrar é uma vaga e titubeante experiência de nós mesmos. Experiência essa que não nos garante nenhum grau de certeza perante os objetos ou o conhecimento em si. Cada caso é único, cada circunstância é significativa em si mesma. Não existe a possibilidade de traçar-se um caminho seguro para o viver bem ou a criação de um manual de instruções que nos leve a isso. Vive-se, vivendo. Por conseguinte, segundo ele, cada circunstância deve ser julgada em suas particularidades, através de um exercício vasto e contínuo de lidar com experiências as mais diversas, de um voltar-se aos fatos e tomar-se a si próprio como objeto e matéria de nossas inquirições.
De certo, este tema não é tratado de maneira tão brusca e simplória como no exposto até aqui. Entretanto, estas questões delineiam pontos importantes na visão que Montaigne parece demonstrar em seu ensaio. Análise que pretendemos fazer do ensaio de número 20 do primeiro livro dos Ensaios de Montaigne. Neste ensaio, o tema da morte é tomado a partir da premissa de que toda a nossa vida seria um lento exercício de preparação para o momento em que iremos deixá-la. Preparar-se para a morte, desta maneira, constituiria uma de nossas metas fundamentais. Nenhuma elucubração metafísica nos eximiria de encararmos de forma viril o correr dos dias e nos desobrigarmos do fato de que vivemos e devemos prepararmo-nos para o dia da partida, encarando o próprio processo como uma atividade constante e necessária. "A passagem pelo pensamento da morte, em vez de desembocar no além, reconduziu-nos para o detalhe mais íntimo e aparentemente mais fútil de um andamento de vida pessoal, inscrito na trama dos dias mortais" (Starobinsky, 1992, pg. 43). Essa preocupação montaigneana com o tema da morte é na verdade uma desobrigação com protocolos religiosos ou outras formas de lidar com o post-mortem. É antes uma obrigação com a nossa vida terrena e prática. Uma escolha moral de encararmos nossa realidade última que é a partida deste mundo. O objetivo deste treinamento moral estaria justificado pelo fato de que é necessário que naturalizemos a morte, visando aprimorar o proveito que tiramos de nossos dias. É preciso racionalizá-la e lidar com ela de uma maneira menos mística e fatalista.
Pode parecer obtuso encarar a vida como uma preparação para o momento em que iremos deixá-la, nossa morte. Visto superficialmente o argumento mostra-se frouxo e inadequado. Porém, na análise saborosa de Montaigne pode-se antever uma série de virtudes inerentes a esse treinamento moral. Não há tanto uma justificação pautada em termos físicos como nos atomistas gregos, sobretudo em Epicuro e Lucrécio. Tampouco há uma tipologia nos moldes da ética aristotélica, há antes uma firmeza de intenções e uma clareza de entendimento, apontando para o fato de que  preparar-se para a morte é uma maneira de atingir a liberdade. Desgarrar-se de todos os aspectos covardes e fatalistas em relação ao momento da passagem seria, então, um ato viril de tomada de consciência perante o mundo e perante si mesmo.  Alguns aspectos estão intrinsecamente ligados a essa discussão: o problema da condição humana, a tomada de posição que ele realiza no final do ensaio em que abre um debate claro com Lucrécio, a visão que se altera no final de sua vida no ensaio presente no livro III.
Fica aí a dica de leitura: Os Ensaios de Montaigne.