sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

Resquícios

Tu és pétala desgarrada.

Semente que germina...

Descontente pelo desencontro em tua flor

Choras pois não é botão,

Tão pouco és rosa.

És na verdade amor que flutua bailarino

Ou dor que seca venenosa?


André Luis Santos

De Fatos e constatações

Crítica à reportagem sobre a falta de professores exibida no jornal televisivo SPTV do dia 13/12/2007

Por André Luis P. dos Santos

É estranho como a parcialidade impera quando o assunto educação é tratado em nosso país. Acabo de assistir a reportagem sobre a ausência massiva de professores na rede e acredito que a situação não esteja muito bem colocada. É fato que haja um número excessivo de faltas por parte de alguns colegas. No entanto, o processo educacional está envolto em um número elevado de fatores que determinam a sua eficácia.

Sou professor da rede há quase 10 anos, sou assíduo e vejo, na escola em que trabalho, uma série de pessoas que possuem uma postura semelhante a minha. É estranho redigir-se uma matéria jornalística em que não se aprofunda devidamente a questão, permanecendo na superfície. Quanto às salas superlotadas, não se pede providências. Quanto à indisciplina e a violência, não se pedem providências. Quanto ao descaso da família, não se pede providências. Quanto à valorização do profissional ,não se pede providências. Quanto ao fato de que a mídia televisa e radiofônica, em sua grande maioria, desestimula a busca pelo conhecimento, oferecendo fórmulas de fácil deglutição que não necessitam da mediação intelectual para serem absorvidas, não se pede providências.

Nós últimos anos, vi uma série de colegas adoecerem, ensandecer e até perderem as suas vidas dentro da sala de aula. Essas coisas não permeiam as telas da TV. São pequenos dramas pessoais que se acumulam amiúde. Pessoas dignas que muitas vezes enfrentam jornadas de 15 aulas por dia, despertando com os primeiros raios de sol e adormecendo quando a lua já vai alta. Muitos renegam sua vida social em favor do trabalho e perdem-se em seus relacionamentos por falta de qualidade de vida. Por que não se fala do imenso número de enfermidades e problemas psicológicos que afligem os profissionais da rede? São questão que deveriam fundamentalmente ser tratadas em uma reportagem como essa.

Baudelaire, Pessoa, Machado, Einstein, os clássicos são complicados demais, não é? Não tenho o costume de subestimar os adolescentes que educo. Meus educandos acabaram de ler o Banquete de Platão. Os do 2º ano leram alguns textos de Freud. Muitos apreenderam o que foi proposto, outros fugiram pela tangente. Mas, certamente ninguém passou com indiferença por essa experiência. O conhecimento fluiu e os objetivos foram atingidos.

Causa-me certo incômodo este tipo de generalização. Há profissionais competentes e entusiasmados dentro da rede. Profissionais que se tornam mal vistos por conta de reportagens parciais como essa. Logo após a exibição da mesma, houve a chamada do quadro profissão repórter. Não sei se foi proposital. Entretanto é irônico que, logo após uma reportagem que supostamente cobra atitudes por parte do governo em relação à educação, se mostre o quanto o brasileiro gostaria de ser famoso. O fato é que irrefletidamente nenhuma das situações citadas pressupõe que as pessoas podem ser famosas pelo que elas pensam, mas simplesmente por um talento natural ou exercitado que dispensa elucubrações mais profundas. A cultura como objeto de desejo está morrendo em nosso país. A escola tenta resgatá-la e relacioná-la com o cotidiano das pessoas. Mas parece que vivemos em um país em que vale mais quem rebola do que quem conhece. É óbvio que isto perpassa as perspectivas, pensamentos e anseios de nossas crianças. Enquanto as pessoas não perceberem que a educação está como está por culpa do coletivo, sairemos apontando para todos os lados enquanto novos projetos mirabolantes surgem a cada novo gestor. Seriedade, respeito, valorização e principalmente comprometimento é o que falta por parte da sociedade como um todo.